
Algo interessante que encontramos nos estudos sobre a música é que provavelmente não possamos traçar com precisão o seu desenvolvimento, mas sabemos que a história da música esta amplamente ligada ao desenvolvimento da inteligência e da cultura humana.
O termo música vem do grego “musiké téchne”, que significa “a arte das musas”. As musas eram entidades às quais eram atribuídas a capacidade de inspirar a criação artística. Na antiga Grécia dizia-se que as musas ligadas a “arte da música” encantavam a todos que as ouviam tocando seus instrumentos. É sobre esse encantamento que quero compartilhar aqui com vocês, e quem sabe incomodar no sentido de direcionar a atenção para uma linguagem poderosa, que ouvimos acostumados e despercebidos todos os dias, mas que pode mudar conceitos, atenuar arestas e na mais sublime das suas funções criar beleza e harmonia.
A preservação da cultura musical, como patrimônio, é de extrema importância para a relatar a história, para fazer com que os acontecimentos passados sejam refletidos e compreendidos. Esse sentimento através de canções e melodias já uniu povos pela história, já relembrou vitórias e derrotas, fazendo da nação vitoriosa, uma nação festiva e orgulhosa pelo feito; e relembrando aos derrotados através de suas canções populares que podiam se reerguer novamente. Como exemplo, certa vez Ludwig van Beethoven, um dos maiores compositores da história humana, teve uma encomenda feita pelo imperador Francisco I da Áustria, que preocupado com a derrota nas Guerras Napoleônicas encomendou a música “As Ruinas de Atenas” para a inauguração de um novo Teatro. A obra abordava temas históricos sobre as lutas de um povo pela sua independência. Exemplos como este são recorrentes, e a capacidade da música de contar parte de uma história atribui a esta nobre arte um valor de relevância.
A música é plural.
Durante séculos muitos e muitos gêneros musicais foram criados, e é importante considerar quais impactos esses gêneros causaram na sociedade e se os impactos foram duradouros. Quais fatores fazem com que a multiplicidade de gêneros musicais seja abundante, e o que isso tem a ver conosco? Sabemos que fatores sociais podem influenciar essas criações.
A Globalização é hoje a grande força para mudança de idéias e cultura musical, devido a vários fatores, tais como:
Localização Geográfica – Região, topografia e clima podem influenciar não só no estilo, mas na longevidade do gênero. Alguns gêneros são muito influenciadores, inclusive fora de sua localização geográfica.
Demanda e Evolução– Muitos gêneros musicais foram e são criados pela necessidade da própria sociedade. Alguns estilos por exemplo foram criados através do gosto pela dança, sendo as vezes apenas a transformação rítmica de um gênero pré-existente de uma cultura imigrada, caso de vários ritmos e gêneros brasileiros. A apropriação do gênero se faz no momento em que esse povo miscigenado se reconhece culturalmente. Através da evolução alguns gêneros nascem da idéia de criar um som diferente para o que já existe e é popular, deixando sempre uma conexão rastreável entre gêneros.
Através da música e sua história, podemos compartilhar valores e costumes, que diferem entre as múltiplas culturas, mas que nos une ao encontrarmos origens supostamente comuns, dando-nos o sentimento de pertencimento.
Necessidade de Expressão – A música como fenômeno social pode refletir vários sentimentos do local onde o gênero é criado, podendo ser uma voz gritando por reconhecimento. Como exemplo Negro-Spirituals, Sorrow-songs e Work-songs foram musicas que permitiam a comunicação, aprendizado e conforto aos que enfrentaram a brutal escravidão no início dos EUA. As influencias e a contribuição dos gêneros afro-culturais nos EUA foram a base rastreável para estilos musicais como Rock and roll, Jazz, Blues, Hip-hop entre outros.
No Brasil temos uma riqueza enorme musical traduzida pelo encontro do europeu, do negro e do índio. Cada um com sua cultura única participou para a formação da nossa música brasileira, do sistema harmônico da música instrumental trazida pelos portugueses à riqueza rítmica da música negra e as influências folclóricas e regionais dos nossos índios. Como disse acima, a criação do gênero musical novo e próprio se faz no momento em que esse povo miscigenado se reconhece culturalmente. Assim nascem nossas fronteiras musicais, verdadeiras marcas de um povo, local onde nos reconhecemos como nação, nossa própria cultura. Assim temos o Maracatu, o frevo, o choro, o samba. Temos nossa ópera, nossa música de concerto passando por Carlos Gomes, Villa Lobos, entre tantos outros gênios da Musica Brasileira, popular, folclórica e erudita.
Impacto familiar – Esse é outro fator que pode gerar mudança e influenciar nas criações. Somos muitas vezes influenciados por familiares, ou por pessoas que crescem e vivem ao nosso redor. Frequentemente a influência vem do modelo musical e preferencias ouvidas e percebidas na infância.
Para finalizar gostaria de relatar dois pontos de uma pesquisa feita na University Rhodes Island, com jovens entre 18 e 26 anos para que possamos refletir na importância da música:
a)Dos pesquisados 84,31% dos participantes da pesquisa relataram ouvir música todos os dias, e o restante ouviam música de 5 a 6 dias por semana.
b)Dos participantes 70,50% relataram que sua família teve influência no desenvolvimento de suas preferências musicais.
Lembrando que a música esta amplamente ligada ao desenvolvimento da inteligência e da cultura humana, temos a responsabilidade de incutir na sociedade que vivemos o hábito de ouvir música, se possível através do incentivo e ensino musical nas escolas, porém, não podemos nos eximir da responsabilidade de guiarmos nossos filhos para a boa música, aquela que te leva a lugares, aquela que te ensina, aquela que te conforta, aquela que te representa como ser humano que deve ser ouvido e respeitado.
Por: Maestro Adriano Machado
Regente Titular da Orquestra Sinfônica Villa Lobos
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